Covid-19: As Supply Chains resistiram ao período de confinamento no Brasil, mas devem se preparar para meses caóticos na retomada

A DIAGMA e a SCAMBO realizaram uma pesquisa com mais de 60 tomadores de decisão, para entender o impacto da Covid-19 nas Supply Chains no Brasil.

A DIAGMA e a SCAMBO, duas consultorias especializadas em Supply Chain, realizaram uma pesquisa com mais de 60 tomadores de decisão, para entender o impacto da Covid-19 nas Supply Chains no Brasil. As conclusões do Aurélien Jacomy e do Paulo Fernandes, sócios das respectivas consultorias: até agora, as Supply Chains funcionaram bem, mas ficaram mais frágeis, e com certeza mais imprevisíveis. Os próximos meses podem ser muito caóticos.

Há três meses, as empresas brasileiras são duramente impactadas pela crise sanitária da Covid-19 : por dificuldade de abastecimento de produtos importados no início, e depois pelas medidas de confinamento, por ter que afastar pessoas contaminadas pelo vírus, pelo fechamento do comércio presencial ou as vezes por um aumento/queda súbita de demanda. De alguma forma, todas as empresas tiveram de reagir de forma rápida para se adaptar e sobreviver à nova situação. Todas, de alguma forma, implementaram um plano de contingência.

A urgência dessa resposta no curto prazo não deve, porém,  fazer esquecer o médio prazo, e a preparação do período de retomada, que será tão caótico quanto o período de confinamento. E nesse momento, a questão chave é como atender a demanda sem aumento dos custos e dos estoques ou perda nas vendas.

Para entender melhor qual foi o impacto da Covid-19 nas empresas, como as Supply Chain se adaptaram à situação, e para antecipar os impactos no momento da retomada, a DIAGMA e a SCAMBO realizaram uma pesquisa de 22 perguntas. Obtivemos 61 respostas, repartidas principalmente nos setores de Bebidas e Alimentos (indústria e varejo), Bens de Consumo, Material de Construção, Prestador de Serviços Logísticos. Esse artigo é uma síntese dessa pesquisa, e nossos elementos de reflexão para preparar melhor o momento de retomada.

 Todos os setores de atividades foram duramente impactados

Para cima ou para baixo, uma variação de venda importante para a quase totalidade das empresas.

O impacto foi forte, em todos os setores de atividades: 68% das empresas tiveram uma queda de pelo menos 10%, sendo que  mais que 24% que responderam à pesquisa declararam ter perdido mais de 50% de venda desde o início da crise. Essa queda impacta todos os setores de atividades representados na pesquisa, inclusive o setor de Alimentos e Bebida, que imaginamos com mais protegido.

Enquanto alguns perderam muitas vendas, outros conheceram um aumento forte de demanda no período. Mas novamente, um aumento muito fora da curva: 15% das empresas conheceram um aumento de venda superior a 50%, necessitando se reorganizar para atender essa demanda com contratações, aumento do prazo de entrega.

Covid-19: As Supply Chains resistiram ao período de confinamento

Demanda online

Verificamos os maiores aumentos no varejo, com destaque na construção civil.  As empresas de bem de consumo e alimentos permanecem estáveis neste item, pois geralmente não possuem estrutura desenvolvida para atendimento por este canal.

Muito se tem falado na mudança de hábito dos consumidores saindo do canal offline para o online.  Este já era um movimento observado antes da Covid-19. Será que de fato haverá uma mudança de patamar permanente no varejo online após a normalização das atividades? Mais respostas teremos no início da liberação das atividades. Fica o ponto de atenção para todas as empresas que este pode ser um plano de contingência em caso de alguma outra crise com similares impactos.

Impacto

Com um aumento do custo de venda

Enquanto as vendas caem, o custo para manter um nível reduzido de faturamento aumentou: aumento do custo do frete, redução da produtividade, adequação das infraestruturas para respeitar as regras de higiene e proteger os funcionários e os clientes.

O quadro operacional das empresas também reduziu, mas em proporções diferentes da venda. Para 52% das empresas, o quadro operacional aumentou proporcionalmente ao faturamento (o que reduze o resultado da empresa). 32% conseguiram ajustar o quadro à nova realidade de faturamento, e 15% reduziram o quadro sem ter perdido em faturamento.

As Supply Chains ainda funcionam

As Supply Chains aguentaram nesse período. Surpreendentemente, a cadeia ainda é confiável. Para 50% das empresas, não houve falhas significativas no abastecimento. Apenas 29% das empresas tiveram problemas graves de abastecimento, com mais de 50% dos fornecedores que não conseguem atender de forma satisfatória. Novamente, essas porcentagens se aplicam para todos os setores de atividade.

Falhas dos fornecedores ou dos prestadores de serviço são preocupações para apenas 32% e 25% das empresas e 80% das empresas não precisaram realizar corte nas quantidades solicitadas pelos clientes.

Do ponto de visto das operações, 96% dos CDs e 93% das fábricas funcionam normalmente ou parcialmente.

A retomada pode ser mais caótica que a crise para as Supply Chains

O fim das medidas de confinamento e a volta de uma atividade econômica maior não significa a volta para o “Business as Usual”. O período de retomada será um período de forte incertezas, principalmente para as cadeias de abastecimento.

Demanda imprevisível

A crise atual terá sem dúvida impactos profundos sobre os consumos. O comportamento dos consumidores será diferente. Essa alteração será progressiva e por consequência, previsível.

No momento da retomada no contrário, a demanda será altamente volátil e imprevisível:

  1. Os algoritmos de previsão não poderão utilizar o histórico dos últimos meses, nem antecipar as variações de demanda dos consumidores no momento da retomada. Alguns setores / produtos devem conhecer uma retomada lenta, outros um aumento forte de compensação da crise
  2. O desconfinamento, muito provavelmente, será progressivo, com uma necessidade de cálculo da demanda muito mais fino do que de costume, por região ou até por cidade.
  3. Cada empresa reagiu à crise de uma forma diferente. A pesquisa mostra que os estoques variaram sem tendência clara para mais ou para baixo: 35% das respostas afirmam que os estoques reduziram, 35% que eles aumentaram e 30% que ficaram estável. Observamos a mesma repartição nos diferentes níveis da cadeia (houve redução para 32% dos estoques de Matéria Prima, 38% dos Produtos acabados e 34% dos Estoques loja, frente a um aumento de 25%, 31% e 45% respetivamente. As empresas precisarão ao sair da crise reajustar os estoques. O Beer Game Effect levará os atores da cadeia a acreditar que a demanda nesse período é muito imprevisível, e a errar no seu planejamento.
  4. Várias empresas sairão numa situação financeira complexa, com pressão forte sobre o fluxo de caixa (é uma preocupação para 46% das empresas). Por consequência, os pedidos provavelmente levarão em consideração restrição de orçamento, e serão diferentes dos pedidos históricos.Covid-19: As Supply Chains resistiram ao período de confinamento

Uma cadeia logística mais frágil

No final, é toda a cadeia de abastecimento, da matéria-prima até a entrega para o consumidor, em todos os setores, que foi fragilizada. As consequências podem não aparecer logo na retomada, mas apenas nos próximos meses: gargalos logísticos, falência de fornecedores, acúmulo de erros e incertezas no planejamento, levando a rupturas na cadeia.

Quarenta e cinco por cento (45%) das empresas tem gerenciado atualmente seus estoques com restrições de capital de giro. As vendas, e ainda mais as receitas, caíram durante a crise, fragilizando obviamente a saúde financeira de todos os fornecedores: de matéria prima, de produto, mas também de transporte ou de serviços logísticos. As empresas entrevistadas estão cientes disso: 45% delas se dizem preocupadas pela solvência financeira dos seus fornecedores.

Ponto positivo, a colaboração parece ter aumentado entre os atores da cadeia nesse tempo de crise: os planos de contingência implementados foram compartilhados não só com os colaboradores da empresa (86% dos casos), mas também com os fornecedores principais (58% dos casos), os prestadores de serviço (55% dos casos) e os clientes (48% dos casos).

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Se preparar para a retomada

Nesse contexto de retomada (demanda imprevisível, cadeia mais frágil, restrições no capital de giro, organização mais complexa e regras de segurança e higiene reforçada), como ajustar os processos para ser mais robusto, como ter sucesso?

Ser mais transparente

Se a demanda será imprevisível, parte disso será devido aos reajustes ou as impressões que as empresas terão no momento da retomada. Por tanto, é importante ser transparente com todos os atores da cadeia de abastecimento, para que cada um possa se organizar com a informação correta. Ou seja, comunicar três informações para seus fornecedores e parceiros:

  • Os volumes devidos aos reajustes de inventário ou apostas que a empresa quer realizar;
  • Os volumes devidos à um cenário de demanda;
  • As incertezas sobre a demanda ou os cenários alternativos. Nesse ponto, será importante discutir os diferentes cenários, além da demanda, com os fornecedores.

Definir suas prioridades

As Supply Chains são construídas para atender as necessidades do negócio: gama de produto e serviço. No momento da retomada, a construção é um pouco mais complexa, levando como variáveis de entrada os objetivos da empresa na retomada, mas também as capacidades efetivas da Supply Chain.

Quais são então as prioridades do negócio, como realizar as arbitragens entre clientes em caso de ruptura, qual é a gama prioritária? Essas questões devem ser discutidas de forma prévia, para acelerar a tomada de decisão quando necessário, e para todos os atores sobre as prioridades da empresa.  Observamos pela nossa pesquisa que esses pontos ainda foram pouco discutidos dentro das empresas: apenas 34% das empresas ajustaram seu portfólio de produtos e serviços desde o início da crise.

Depois desse alinhamento sobre prioridades, será importante ajustar os KPIs e os processos (especialmente o processo S&OP) para que eles reflitam essas mudanças.

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Trabalhar com vários cenários e preparar planos B

A maioria das empresas com quem conversamos trabalham com vários cenários de velocidade de retomada e de demanda. Porém, os cenários não podem parar na demanda, e devem ser ampliados para todos as variáveis da cadeia de abastecimento: disponibilidade da mão de obra, falência de fornecedores, capacidade de abastecimento em caso de aumento da demanda, etc.

A construção de uma Supply Chain mais robusta faz parte dos principais projetos citados pelas empresas na pesquisa, com impactos em várias frente da Supply Chain:

  • Revisão da malha logística e das capacidades de produção (53% das empresas);
  • Mudança e diversificação do sourcing (39% das empresas);
  • Alteração da frequência e quantidade dos itens comprados (34% das empresas, 21% já alterou seu mínimo de pedido).

Ter uma cadeia mais robusta também passa por ter uma maior visibilidade da cadeia de abastecimento, e uma digitalização da Supply Chain, por 52% das empresas.

Uma sobrecarga das equipes na retomada

Essa pesquisa nos trouxe vários elementos de reflexão sobre a evolução das Supply Chains para os próximos meses. Muito foi feito para reagir à crise e as Supply Chains parecem ter resistido nesse momento. Mas o momento da retomada deve ser planejado com muito cuidado, já que o período pode ser ainda mais caótico do que a fase de confinamento.

Com projetos importantes a conduzir durante a retomada (revisão das prioridades da Supply Chain, e construção de uma Supply Chain mais robusta), surge a questão da disponibilidade das equipes. Por restrição financeira, várias pessoas foram desligadas das empresas (ou colocadas em férias); a gestão de um Supply Chain na retomada, mesmo com demanda mais baixa, demandará mais tempo operacional; a parametrização dos sistemas para se adequar a realidade dos próximos meses também será um aumento da carga de trabalho para usuários chaves e as equipes de TI.

Nesse contexto, como repensar a Supply Chain e colaborar mais com os fornecedores, de uma forma serena e coerente? Acreditamos que o engajamento das equipes deve ser realizado, quando possível, na continuidade e no longo prazo, durante a crise, a retomada, e depois da crise, com um direcionamento claro da diretoria da empresa.

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Aurélien Jacomy

Aurélien Jacomy (ajacomy@diagma.com): sócio diretor da DIAGMA Brasil. Formado em Engenharia de produção em 2007 e mestrado em Logística na École Centrale Paris. Começou a sua carreira na L’Oréal e após na Bolloré Africa Logistics em Angola. Em 2012, ele abriu a subsidiária DIAGMA Brasil.

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Paulo Oliveira

Paulo Oliveira (paulo@scamboconsultoria.com.br): sócio da SCAMBO Consultoria. Formado em Engenharia (USP), com especializações em Administração (FGV) e Logística (ILOS). Trabalhou em empresas nacionais (Abril Sadia/BRF) e multinacionais (Souza Cruz, Danone, Unilever), sempre em gestão de Supply Chain. É professor no MBA FGV desde 2014.

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